23.6.05

Norbert Casteret

Apresento-vos um pequeno excerto das "memórias dum explorador de cavernas", bem conhecido por todos aqueles quem têm alguma noção da História da Espeleologia. Recomendo vivamente a sua leitura a todos os interessados, o original em Francês é mais agradavel, a tradução para Português é antiga e deixa um bocadinho a desejar, na minha opinião...




"Por os ter acometido e explorado, conheço e adoro os abismos, as cavernas e os rios subterrâneos.
Esta paixão arrastou-me aos arcanos virgens da Terra, onde encontrei os maiores prazeres da minha vida, e a cujo estudo há longos anos me consagro.
(...)

O estudo da Pré-História, da Paleontologia, da Geologia, abre campo ilimitado a pesquisas e observações interessantíssimas e a fecundos devaneios.
Onde experimentar tantas comoções, saborear espectáculos tão estranhos, viver horas tão amarguradas umas e tão poéticas outras, sentir tantas satisfações e prazeres de espírito, como na exploração sedutora e perigosa dos mundos subterrâneos?
(...)

O selvagem encanto dos mundos subterrâneos, afigura-se-me injustamente apreciado. Imagina-se que uma gruta é um local de terror, triste e hediondo, e que os abismos não são mais do que perigosas carantonhas da natureza.
Quantas galerias os meus olhos não têm contemplado, que ultrapassam em majestade e arquitectura as mais belas naves das catedrais, objectos de admiração humana.
Que delicadeza de formas, variadas até ao infinito, e que pureza de diamante naquelas cristalizações elaboradas no seio da terra!
Que mundo de pensamentos nos assalta nesses abrigos profundos, aonde os nossos longuíquos antepassados da idade da pedra se aventuraram, para ali celebrarem comoventes e terríveis cerimónias, e enterrarem os seus mortos! Quanta emoção ao encontrar, após milhares de anos, os seus ossos, as suas pegadas, as suas armas primitivas e os vestígios curiosíssimos das primeiras manifestações artísticas gravadas na rocha...
Onde encontrar maior recolhimento e mistério que sob as abóbadas marmóreas desses templos naturais, cujas proporções grandiosas nos confundem? É certo que a luz e a vida se encontram banidas desses sepulcros da natureza, mas o silêncio majestoso e esmagador que ali domina é suficiente para povoar os sombrios labirintos.
Contituem, por outro lado, uma dura escola. As mais severas lições coroam essa aventura, entre ciladas, nas trevas das cavernas. Mas, em contrapartida, como é violento o prazer de dominar o medo e os obstáculos materiais de certas expedições, de descobrir segredos, de decifrar enigmas, de ver confirmar-se uma hipótese laboriosamente concebida, de surpreender, enfim, debaixo da terra, em acção, as forças misteriosas da natureza."


Norbert Casteret,
in Dez anos debaixo da Terra, 1940
(Excerto da introdução)
Livraria Tavares Martins-Porto

1 comment:

Anonymous said...

Fantástico!